quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A Grande Ilusão

(Escrito em 1º/11/2009. Alterações: Virgínia passa a se chamar Christine; várias partes confusas - e ainda na vibe "Júlia = Christine" foram suprimidas)

Parte I

César, num primeiro momento, achou que tinha acordado de um longo pesadelo. Porém, sabe muito bem que tudo que ocorrera naqueles últimos 5 meses e meio era realidade, por mais terrível que fosse. Seu primeiro relacionamento amoroso acabou, e ele está até aliviado com isso.
Ele ainda não entende por que insistiu na ilusão de achar que era Christine a garota de sua vida. Pior ainda: de confundi-la com Júlia, sua amiga e eterno ideal romântico. Hipóteses não faltam: imaturidade, ingenuidade, passividade, pedestaltismo, empolgação de 1º namoro... quem sabe, até um certo prazer em ser enganado. Desta vez, ele teve uma desilusão bem diferente das anteriores; ao invés do padrão platonista, chegou a namorar a garota. Precisou das mais diversas e amargas experiências para chegar a um desfecho.

Tudo começou naquele churrasco, em que sua paixão por Flor havia murchado. O abalo emocional havia sido intenso, e, por mais que ele já estivesse mais tranquilo nas 2 semanas seguintes, ainda estava propenso a tomar decisões precipitadas para esquecer sua recente crush. Uma delas foi na festa da Biologia, quando dançou durante várias horas com Christine, uma garota por quem aos poucos sentia uma atração. Na semana seguinte, almoçou com ela, conversaram bastante, buscava-a na saída das aulas de 3ª e 5ª... logo, não demorou para a garota insinuar que ele estava apaixonado por ela - algo que César prontamente negou, embora seu coração ainda estivesse em dúvida.
Então, veio o fatídico 17 de Maio. Parecia haver um mal-estar generalizado no grupo de amigos, que se reuniram naquela data para celebrar o aniversário de Júlia. Mário estava às vésperas de uma semana de provas, e não estava conseguindo se concentrar nos estudos. Giovana teve pesadelos, envolvendo a morte de sua mãe. Henrique estava lidando com a pressão de seu grupo estudantil ter chegado ao poder do diretório, e o stress contaminava-o perigosamente. Alice estava em nova crise existencial; questionava-se sobre o valor de viver de forma tão promíscua e boêmia, sem nada de estável e harmônico no seu cotidiano.
Júlia, a aniversariante, estava cada vez mais apaixonada por César, mas também progressivamente incapaz de revelar isso a ele; sabia, no fundo, que o perderia novamente. Na supracitada festa dos Gates of Dawn, ela quase se aproximou dele, mas Christine apareceu antes, e ele, frágil que estava, tratou esta como se fosse Júlia, em uma estranha ambiguidade ontológica. O caminho que ela pavimentara, ao ajudá-lo a esquecer a Flor, novamente teria um desvio, e ela temia que este seria um longo.
César havia acordado em clima de "Gloom", disposto a se entregar a um relacionamento para se curar da solidão angustiante em que estava. Embora fosse amigo de Christine há apenas algumas semanas, gostava dela o suficiente para tentar alguma coisa. Felizmente, ainda não estava platônico em relação a ela, o que era uma "trava" a menos. Chegou a ir ao birthday de Júlia, mas estava tão monomaníaco que nem conversou muito com ela. Foi cordial, no entanto, pois não ignoraria aquela por quem estava pronto a "projetar" em Christine. Quando chegou em casa, pretendendo estudar para a prova de Francês e para a aula sobre Robert Nozick, recebeu uma ligação que mudaria a sua vida: Christine o convidara para estudar naquela noite. Porém, César avisou que Mário também estava na kit-net, então ela fez outra proposta: saírem para o McDonald's.

Júlia ficou calada diante da descoberta, e evitou ver seu amigo pelas semanas seguintes. Para piorar, Christine também era colega de Júlia; conheceram-se por intermédio de Alice. Porém, por não saber da paixão de Júlia por César, contava-lhe despreocupadamente detalhes sórdidos da relação.

O namoro César-Christine foi, desde o início, dramático. Ele era marinheiro de 1ª viagem, e estava se deparando com situações completamente diferentes daquelas a que estava acostumado. Ela, emocionalmente instável e de personalidade forte e inconsequente, queria um namorado que beijasse o chão no qual ela pisasse, e a tratasse como um pai, um guia.

Os cinco primeiros dias, contudo, foram especiais; talvez, os melhores de todo o namoro. Foi a época em que as descobertas ainda envolviam poucas responsabilidades, o que amplificava a diversão. Temos, por exemplo, a noite em que dançaram Smiths e leram Nietzsche no quarto dela. Encerrada essa lua-de-mel, veio o melodrama. César não conseguia ver que os comportamentos que para ele eram 'naturais', para sua namorada eram 'egoístas', e aquilo que julgava mudança era, para ela, apenas continuidade.

Christine se irritava, brigava e se desculpava por motivos banais. Incerta sobre seu futuro acadêmico, brigada com a família e convicta de que as pessoas não gostavam dela (e até mesmo a desprezavam), V. estava em um período sombrio de sua vida, o que fazia a crise existencial de Alice parecer amena.
Seria César capaz de lidar com isso? Durante todos esses 5 meses e meio, ele se convenceu de que estava apto a ajudar sua namorada. Não sabia que um relacionamento não pode se fundar em tal desequilíbrio, e que a tranquilidade e a serenidade devem ser recíprocas. Consequentemente, ele próprio acabou se afundando durante essa saga, como veremos.

Parte II

As coisas começaram a sair do controle na véspera do Dia dos Namorados, quando Christine descobriu que Henrique, grande amigo de César, não gostava dela, e tinha uma imagem negativa que até relatara a César, dias antes do namoro começar. Dizia que a achava uma garota liberal, que seu amigo deveria ter coragem para tentar alguma coisa com ela. Christine tomou aquilo como um xingamento, algo do tipo "sou fácil, pegável e descartável". Brigou feio com ele, e disse pela primeira vez (viriam outras 15 nos meses seguintes, segundo as contas de César) que queria terminar o namoro. Por um lado, César não quis enfrentar seu amigo para defender a honra da sua namorada; porém, como ele não via na atitude de Henrique um desprezo maldoso por V., mas apenas uma 1ª impressão errada, decidiu apenas parar de falar com H., mas em Agosto não viu mais sentido nesse afastamento e reatou a amizade. Tentou fazer com que este pedisse desculpas para Christine, mas Henrique não via sentido em pedir perdão por algo que não considerava errado. Ela tomou o fato de ele não vir falar com ela como um desrespeito profundo, e atormentou César sobre esse problema durante todos os meses seguintes.
Nas férias, ambos fizeram duas viagens juntos. A primeira foi para Pastória, cidade natal dele e de seus 5 melhores amigos. Christine conheceu a família dele, e, embora tenham tido predominantemente bons momentos, no último dia houve uma certa tensão entre ela e a avó de César. A mãe dele não se surpreendeu, pois tanto Christine quanto a avó tinham o gênio forte e detestavam ser contrariadas. Logo em seguida, foram para Soterópolis, metrópole em que Christine nascera. Seguiram-se duas semanas muito tensas, em que, pelos mais diversos motivos (remédios, comida estragada, indisposição com familiares etc.), Christine entrou em confronto com César. Chamava-o de coisas horríveis, para horas depois chorar e fazer as pazes. O rapaz ficou certamente confuso com tudo isso, mas já se encontrava em uma situação em que não havia muito o que fazer. Se quisesse continuar o namoro, teria que aceitar Christine como ela era, e se esforçar ao máximo para agradá-la e parecer contente; mas, se achasse melhor terminar o relacionamento, ela o convenceria a reconhecer suas falhas e prometer melhorá-las para prosseguirem o namoro. A essa altura, a ambiguidade ontológica já estava se dissipando. César não via mais a necessidade de dizer a si mesmo que Christine era a sua Júlia, pois já havia se acostumado com a realidade nua e crua. Porém, é possível que parte da decisão dele por essa "separação" tenha tido outros motivos; haveria um desencanto a caminho?
Agosto chegou, e com ele, voltaram as aulas da UNICOS. Após os problemas acadêmicos do semestre anterior, que lhe acarretaram um colapso nervoso, Christine havia pego menos matérias, para se focar mais nelas e evitar excessos estafantes. César também estava fazendo menos créditos, mas o motivo era outro - o grupo de pesquisas no qual havia entrado, que lhe consumiria várias horas semanais.

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